sábado, 2 de fevereiro de 2019

Palestra "Tráfico de seres humanos e exploração laboral"

Os alunos da turma 11LH1 desenvolveram os seus textos subordinados ao tema "Tráfico de seres humanos e exploração laboral", na disciplina de Filosofia, sob a orientação da professora Luísa Marques e em colaboração com a biblioteca escolar. A 29 de janeiro, pelas 11:50h, um grupo de alunos da turma partilhou as suas conclusões e inquietações para uma plateia de colegas das turmas 10LH2;10LH3; 11LH4 e11LH5. A partilha foi extraordinária e o objetivo alcançado: a sensibilização dos colegas para um assunto tão sério quanto preocupante que é o tráfico de seres humanos e a exploração laboral, um tema que deveria ser, para o cidadão do séc.XXI, mais um momento lamentável, da história sangrenta do Homem da Idade Média!







Eis o texto dos alunos:

Tráfico de seres humanos e exploração laboral

“Desumano” e “doentio” são alguns dos adjetivos utilizados pela OIKOS, uma organização não-governamental voltada para o desenvolvimento mundial, para descrever o tráfico de seres humanos e exploração laboral a que a atualidade está sujeita.
Como entender esta realidade em pleno século XXI??
Afinal, tráfico e exploração são novas formas de escravatura, mas…a escravidão não foi abolida? Não foram assinados acordos mundiais para a sua supressão?
Precisamente a 10 de dezembro de 1948, a Assembleia Geral da Organização Das Nações Unidas adotou e proclamou a Declaração Universal dos Direitos Humanos que definem explicitamente os direitos que abrangem cada um de nós. A mesma cita: “Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direito. Dotados de razão e de consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade”.
       No entanto, 70 anos após a sua criação, em pleno século XXI, ainda é possível testemunhar inúmeras, graves e inequívocas violações dos direitos humanos, com destaque para a discriminação de grupos étnicos, a intolerância entre povos, a injustiça, a opressão, a tortura física e psicológica e, por fim, a escravidão. Efetivamente, nas últimas décadas tem-se assistido a um aumento progressivo deste tipo de situações que privam os indivíduos do seu livre-arbítrio, como, por exemplo, o tráfico e a exploração de Seres Humanos, e que põem em causa o que foi decretado na Declaração anteriormente referida, mais especificamente o que está definido no seu 30º artigo que explicita que ninguém pode tirar-nos os nossos Direitos Humanos e o 4º artigo que nega e condena a escravatura. Deste modo, não será possível constatar que os direitos do homem se encontram mais próximos de ser uma utopia do que propriamente uma realidade?
 Relativamente a este flagelo, o tráfico de seres humanos, a Organização das Nações Unidas (ONU), no Protocolo de Palermo, assinado em 2003, define o mesmo como “o recrutamento, o transporte, a transferência, o alojamento ou o acolhimento de pessoas, recorrendo-se à ameaça ou ao uso de força ou, ainda, a outras formas de coação, ao rapto, à fraude, ao engano, ao abuso de autoridade ou à situação de vulnerabilidade, entrega, aceitação de pagamentos ou benefícios para obter o consentimento de uma pessoa que tenha autoridade sobre outra para fins de exploração. É importante referir que o consentimento de uma vítima durante este processo, quer na forma tentada quer na forma consumada, é irrelevante se tiverem sido utilizados quaisquer uns dos meios apresentados. 
 O tráfico de seres humanos assenta em três fases: o recrutamento, o transporte e a exploração. O recrutamento consiste na angariação das vítimas de tráfico e ocorre de diferentes formas, variando de acordo com o tipo da vítima visada (adulto ou criança, homem ou mulher) e o tipo de exploração que se pretende realizar.
 O que está na base do recrutamento, a primeira fase deste processo, é o puro engano: com o intuito de atrair uma pessoa e conduzi-la até à situação de exploração, é-lhe prometida uma condição futura (em termos de trabalho, estudo ou outros) que nunca se  chega a concretizar.  Assim, os traficantes aproveitam-se dos sonhos, dos desejos, dos objetivos e necessidades da vítima para a conduzir até esta horrível situação. Na maioria das vezes, os aliciadores, homens ou mulheres, são pessoas com que as vítimas têm laços afetivos. Muitas vezes, apresentam um bom nível de escolaridade e são completos sedutores com uma elevada capacidade de persuasão.
 O transporte das vítimas é a segunda fase do processo de tráfico. Este transporte pode ter como destino um local no próprio país onde a vítima foi recrutada ou um país diferente, implicando a transposição de fronteiras, sendo que os meios de transporte utilizados podem ser os mais diversos. As condições a que estão sujeitas as vítimas são precárias e completamente desumanas. Muitas vezes, as vítimas encontram-se sem oxigénio suficiente, em transportes preenchidos excessivamente de passageiros, em lugares inapropriados (juntamente com a carga de camiões, barcos ou aviões) que colocam em risco toda a integridade física e a vida das pessoas transportadas. 
A fase de exploração conclui o ciclo de tráfico, sendo o seu objetivo principal o aproveitamento económico, seja porque a vítima desempenha um trabalho sem remuneração, gerando lucro aos exploradores, ou mesmo quando a própria vítima obtém dinheiro ou bens materiais, e é obrigada a entregá-los aos exploradores.   
É de realçar que este verdadeiro drama das sociedades encarna um negócio no sentido exato do termo, na medida em que é extraordinariamente rentável comprar e vender pessoas, pessoas essas que, quer pela sua vulnerabilidade, iliteracia, pobreza, quer por outras razões, se sentem aliciadas e sonham com um futuro melhor.
Estas vítimas são, maioritariamente, usadas para a prostituição, pornografia, muitas vezes infantil, trabalhos forçados, escravidão, remoção de órgãos e tecidos, adoção ilegal, para casamentos precoces e para o recrutamento de crianças-soldados.
O tráfico de seres do sexo feminino, já previamente referido, é um dos mais frequentes tipos de tráfico humano. Estas, são usadas como objetos sexuais, que permitem aos traficantes obter elevados lucros. Não fazem ideia de que estão a ser recrutadas para a exploração sexual, pelo contrário, são iludidas e levadas a acreditar que foram escolhidas para trabalharem, geralmente, como modelos, bailarinas, entre outras. Permanecem em cativeiro, sofrem maus tratos e trabalham, por norma, 10 a 13 horas diárias na prostituição, sem poder recusar clientes e sendo constantemente submetidas ao uso de drogas.
 Não fosse uma realidade atual, porém cruel e por muitos ignorada, provavelmente custaria e custa aceitar as estatísticas desta forma de tráfico que se traduzem em cerca de 800 mil pessoas traficadas por ano, em todo o mundo. Segundo a ONU, o tráfico de pessoas movimenta atualmente 32 bilhões de dólares em todo o mundo. É de realçar que deste valor, 85% provêm da exploração sexual.
 De igual modo, não podemos ficar indiferentes a um dos grandes problemas que atinge todas as sociedades no geral, quer os países marcados pela pobreza, instabilidades políticas, desigualdades económicas, países que não oferecem possibilidade de emprego, educação e perspetivas de futuro para os jovens, ou seja, países em desenvolvimento, quer dos “ditos” países desenvolvidos. Contrariamente ao que acreditamos, este flagelo não afeta única e exclusivamente as zonas de África, Ásia e América Latina. Pensamos que estamos seguros e isolados no nosso cantinho da Europa. Enganamo-nos. Estatísticas obtidas a nível global têm demonstrado que, cada vez mais, são identificadas vítimas de tráfico humano naturais de países desenvolvidos. Com efeito, todos os Estados deverão ter a obrigatoriedade de cooperar entre si, em conjunto com organizações não governativas pelo mundo fora.
O tráfico de seres humanos cresceu na Europa e em Portugal, nos últimos anos, segundo denuncia o sindicato da Carreira de Investigação e Fiscalização do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, que fala sobretudo na exploração de trabalhadores agrícolas e no tráfico de crianças africanas. Isto quando se assinalam os dez anos da Convenção de Varsóvia (para assinalar a data, o Conselho da Europa organizou uma conferência).
  Para além do resto do mundo, também Portugal é um país de origem, trânsito e destino de Tráfico Humano. De acordo com os relatórios anuais produzidos pelo OTSH, Observação de Tráfico de Seres Humanos, a maioria das vítimas confirmadas no nosso país, em 2010, terá sido traficada para fins de exploração laboral. A tendência manteve-se, quer em 2011, quer em 2012. 
No que diz respeito à georreferenciação do crime, em 2009, o OTSH terá apresentado a região norte como um das zonas do país em que mais se fez sentir o fenómeno. Nesse ano, foram sinalizadas situações de tráfico humano em cinco municípios do distrito de Braga, os mesmos em que a OIKOS, uma organização de cooperação e desenvolvimento, se propôs intervir: Barcelos, Braga, Guimarães, Póvoa de Lanhoso e Vila Nova de Famalicão. Também a APAV, a Associação Portuguesa de Apoio à Vítima, tem tido um papel fundamental no apoio às vítimas de tráfico humano e na sensibilização desta problemática.
  Tendo assumido toda esta dimensão, as autoridades perguntam-se de que forma devem combater o tráfico e exploração de seres humanos. Neste sentido, a prevenção e a sensibilização são sempre as melhores iniciativas. Os esforços devem ser orientados, cada vez mais, de forma a criar técnicos, capacitar as instituições, sensibilizar as famílias e as pessoas, e criar uma espécie de capacidade de defesa colectiva contra este mal. Os meios de comunicação social devem desempenhar o seu papel na disseminação de informações que levem os cidadãos a redobrarem a vigilância, não só no dia 30 de julho, o Dia Mundial Contra o Tráfico de Pessoas.
É-nos exigido conhecimento. É fundamental que os cidadãos conheçam os seus direitos, que tenham informação clara e acessível sobre o teor deste crime, que saibam reconhecer possíveis situações de exploração e que saibam procurar ajuda caso verifiquem que os seus direitos não estão a ser respeitados. Devemos duvidar sempre de propostas de trabalho fácil e lucrativo, sugerir a leitura de um possível contrato de trabalho, evitar tirar fotocópias de documentos pessoais e deixar um endereço, uma localização aquando uma possível deslocação.
Mas, sobretudo, devemos apostar na educação, pois quanto mais preparadas, educadas,  as pessoas estiverem, melhor conseguem evitar situações de risco. É aqui que a escolaridade desempenha um grande papel, e é por essa mesma razão que se devia investir mais neste setor, sobretudo em países com baixos níveis de cultura e qualidade de vida, como por exemplo nos países em desenvolvimento.

Mas será isto suficiente para acabar com as enormes redes de tráfico que estão constantemente a surgir? Ao que nós respondemos, não. Enquanto nós pensamos que estamos a fazer a diferença ao libertar milhares de mulheres, estão outras tantas a ser violadas. Enquanto nós pensamos que estamos a fazer a diferença ao apreender milhares de manipuladores, estão tantos outros a criar os seus próprios esquemas, explorando milhares de inocentes. Eles dividem-se para conquistar, e nós? Nós observamos? Esperamos o melhor para aqueles que estão a morrer às mãos de traficantes?
E, sobretudo, para combater este drama, devemos compreender que a diferença começa com a nossa atitude individual, no compromisso, no respeito pelo outro e não se resume apenas à ação dos agentes de autoridade. O compromisso deve ser de todos e não devemos, sob nenhuma circunstância, partir do princípio que não podemos fazer nada. Somos nós, a geração que amanhã vai estar à procura de emprego, à busca de sonhos pelo mundo fora, esfomeados para que uma grande oportunidade nos apareça. Quem sabe, a ambição e a esperança nos torne cegos, e sejamos nós as próximas vítimas que acabam enganadas, burladas, maltratadas e exploradas. 
Por um lado, é de notar que vivemos atualmente numa suposta sociedade mais tolerante e recetiva ditada por um “boom” tecnológico, nunca antes experienciado, devido à nossa capacidade do uso da razão como motor de progresso.
  Porém, como é que somos capazes de aplicar a expressão “progresso” à humanidade quando, passados, aproximadamente 500 anos, da época em que Portugal e algumas potências europeias manifestavam a sua supremacia perante povos de cores de pele e traços físicos diferentes, os tratavam como meros objetos usados e os apelidavam de “escravos negros”, continuamos a praticar precisamente o mesmo género de violações, mas de forma mascarada, isto é, oculta?
 Será que evoluímos ao longo do tempo com a finalidade de nos tornarmos uma espécie cada vez mais desenvolvida ou iremos ter sempre esta faceta cruel e impiedosa?
Para finalizar, lembremo-nos de que apesar de o mundo em que vivemos ser por vezes cruel, devemos, cada um de nós, fazer os possíveis para tentar emendá-lo, lutar por um mundo onde a paz e o amor permaneçam em primeiro lugar e onde seja finalmente possível, conseguir viver em plena felicidade.
 Mesmo que na maior parte das vezes acreditar num lugar assim pareça uma verdadeira utopia.
 Só assim estaremos aptos a aplicar o conceito progresso à humanidade.
Esperemos que tenham ficado esclarecidos e que tenham ganho plena consciência sobre esta problemática do tráfico e exploração de seres humanos porque continuamos perante o fenómeno de escravatura, o mesmo que nos assolou há quinhentos anos, apesar de vivermos tempos modernos.

NOTA: Texto dos alunos do 11ºLH1, para a palestra dada aos colegas dos 10º e 11º anos, após um trabalho de projeto em que pesquisaram a temática e se posicionaram face à mesma. Nesse trabalho, estiveram envolvidas as turmas 11ºLH1, 11ºLH2, 11CT5 e 11CT6, sob orientação da professora de Filosofia, Luísa Marques. Os textos dos alunos podem ser consultados neste mesmo blogue, nas pastas do 11LH1/11LH2 e 11CT5/11CT6.

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